terça-feira, 17 de novembro de 2009

Ao Zé R.

Mario Cherubino na Antero de Quental olhando para as janelas dos prédios debruçados todos em volta da praça. Olhou para as árvores todas, muitas vezes, em especial aquela que recebera cuidados especiais do José. Não era um dendrólatra como ele, mas lhe agradava a presença das árvores ao redor. Plateia muda que só chiava quando o vento corria. E o que ele acharia? Evocaria mentalmente o Schiller, na certa.

Mario sentado ali na praça, em meio à tantos oceanos, deslizando tectonicamente o pensamento por tantas ruas do centro do Rio de Janeiro que andou conforme citado por José, em seus contos.
Cada linha escrita pelo Zé R. fora devorada dentro daqueles dez minutos em meio à escuridão daqueles mapas que não o levavam para lugar algum, inúmeros logradouros de Ubá, Montes Claros, e outras cidades mineiras cujas praças, residências, igrejas e vielas ele percorria do alto, inserindo dados, acompanhando curvas, quadras, distante das lágrimas no portão, das risadas no boteco com mesa de sinuca de tecido rasgado, do aroma do alho dourando; tudo isso acontecia em uma dimensão alheia à todos aqueles traços impessoais que ele desenhava sem nunca deixar de sentir a si mesmo como um impostor.
Foi para lá como Roque também fora um dia, não para balear seu rival nas pernas por causa de uma mulher, mas para confrontá-lo, diretamente, ele, o Cobrador. Foi quando o interpelou.

- Zé?
- Hum? - virando-se bruscamente
- Sou o Cherubino. Mario Cherubino, lembre bem. Precisava encontrar o senhor pra lhe entregar isto aqui – estendendo-lhe um envelope pardo.
- Você é um Hamsun pedindo orientação para seus escritos? Me desculpe, mas já imagino que o que tem aí dentro são excrementos, não prestam para nada. Se fossem realmente bons, não precisariam da minha opinião. Até mais ver – e já ia firme no sentido oposto, abreviando a conversa.

Mario permaneceu ali. Olhando fixamente pra lugar nenhum. Logo em seguida, depositou o envelope ao pé da jovem árvore adotada pelo Zé e sumiu dali. O metrô manobrou para partir. Não havia nada escrito naquelas páginas. Absolutamente brancas. Mas agora o vegetal adolescente estava apavorado com aquela amostra tão próxima de seu futuro mais pardo: tornar-se um sulfite branquinho esquartejado em folhas tamanho A4. Seu horror seria tanto, que logo o José interviria para confortar-lhe. E lembraria do envelope que recusara. E acharia meu nome em sua memória. Em questão de segundos se aproximaria do meu blogue. E seria feito prisioneiro injustamente em um conto absurdo, dançando e cantando à contragosto no realejo de palavras dissonantes de Mario Cherubino, estando inclusive à mercê do teto incerto de batalhar por um papel num conto, talvez no revés de acordar ali no Armazém Nove.

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