sábado, 27 de março de 2010

Capítulo 4 – Só trabalho e nenhuma diversão fazem de você um grande bobalhão

O banheiro do andar que tem o cinema é o melhor do shopping. Era lá que eu estava quando ouvi a discussão. Toda hora tem alguém discutindo: no ônibus, em casa, na rua, nos botecos; mas a discussão aqui era por causa de uma cobrança. Não ficava claro pra mim, ali dentro da cabine, do que se tratava, mas dava pra perceber a parte do diálogo que cobrava era cada vez mais maiúscula, gritos em caixa alta, o receptor que estava sendo cobrado só tentava amenizar e pedia para que o prazo fosse estendido, mais um dia ou dois, no máximo, e estaria tudo resolvido.
Daí, a frase, eu lembro como se fosse agora mesmo, que disse o cobrador, sílaba por sílaba, como se estivesse numa peça de teatro: “Minha guitarra quer matar a sua mãe”. Depois disso, aquele estampido seco soou três vezes, veio o barulho de pessoa caindo honestamente no chão e som dos passos bem pisados daquele que cobrava forma diminuindo porta afora. Eu só ouvia a respiração débil do sujeito que eu via agora pela fresta embaixo da cabine, foi quando puxei o trinco e abri a porta.
Disse à ele que estava ligando pra polícia, pros bombeiros, qualquer ajuda. Ele protestou e fez sinal para que eu me abaixasse. Como nos filmes, quando você está nas últimas, dizer um segredo a alguém é a última coisa que você faz com o pouco de vida que lhe resta. Foi o que o sujeito fez. Disse exatamente assim: “Murdo MacLeod, duzentos e vinte e dois”. Fechou as aspas e morreu ali deitado no banheiro. Eu era a única pessoa na cena de um crime que acabara de ser cometido, então, era um milagre que ninguém tivesse chegado ainda – isso era estranho – , por isso saí dali o mais rápido possível.
Metros distante do banheiro vi que havia uma confusão, muita gente correndo, bombeiros isolando as Lojas Alabama, pedindo para ninguém entrar em pânico porque o princípio de incêndio fora controlado e estava tudo bem. Era uma coincidência violenta? Um homicídio passar despercebido no banheiro de um shopping por causa de um fogaréu nas Lojas Alabama, isso é inacreditável. E perdi alguns minutos pensando nos dvds que poderiam entrar em liquidação por causa de um estojo meio derretido, deformado pelo calor. Recobrei o juízo, notando que eu havia recebido uma generosa lambida da língua dourada da boa sorte e evacuei à mim mesmo dali. Murdo MacLeod, 222.

Um comentário:

UM THRILLER DAS DIFERENÇAS disse...

[off topic]

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Sinopse:

Marshall (David Rasche) é o chefe do Departamento de Imigração do aeroporto JFK, em Nova York. Comemorando seu último dia de trabalho, Marshall resolve se divertir complicando a entrada no país de vários latino-americanos. Entre eles está Nonato (Irandhir Santos), um brasileiro radicado nos EUA, dois poetas argentinos, uma bailarina cubana e um grupo de lutadores hondurenhos. Dois anos depois, Marshall vem ao Brasil procurar uma menina de nome Luiza. Quando ele conhece Bia (Cristina Lago), uma jornada em busca de redenção se inicia. Olhos Azuis foi o grande vencedor do II Festival Paulínia de Cinema com seis prêmios, incluindo o de Melhor Filme.

No Twitter: @olhosazuisfilm