quarta-feira, 11 de novembro de 2009

14 de Outubro





Dias esquisitos. Ônibus esquisitos. Vinte pratas. Precisava receber o troco antes que o próximo sujeito na roleta passasse por mim, porque só haviam dois lugares no ônibus: um no corredor e outro naqueles bancos de trás, que seriam meu plano “b”. Pois não faltou agilidade e presteza ao cara da camisa azul-clara, ele me deu o troco no tempo certo, mas errou o cálculo do alvo. As notas estavam na minha mão, as moedas, espalhadas no chão. “Desculpa aí, cara, me desculpe mesmo”, me disse ele. Não havia o que desculpar, uma besteira à toa. Abaixando pra pegar as moedas, dei passagem para que pegassem o lugar no corredor; ao me erguer novamente, era já ocupado o lugar nos bancos atrás do trocador. Um moleque de uns onze anos sentado no começo do corredor olhou pra minha cara e pareceu dizer que eu era um babaca diplomado por causa do evento das moedas. Óbvio que aquilo era uma forma estúpida que eu dizia pra mim mesmo o quanto eu estava me sentindo idiota. Por isso tratei de providenciar a trilha sonora, segundo dia da programação de ontem, que continha Giant Sand, Ryan Adams, Grizzly Bear, Camera Obscura, Of Montreal, Sufjan Stevens e algumas músicas do “I'm not there”.
Nenhuma música aderia. Até mesmo “X-tra Wide”, do Giant Sand, que funcionara maravilhosamente na primeira audição, hoje soava apenas um amontoado de acordes, notas graves passando sem alarde algum, como o metrô faz todo dia da Uruguaiana até a Carioca. Passei direto pelo Ryan Adams e pelo Grizzly Bear também. Camera Obscura emplacou uma: “Away with murder”. As que tiveram algum sentido foram “As I went out one morning” e “The lonesome death of Hattie Carroll”. Emborquei num sono desconfortável, de ônibus cheio e interrupções de paradas intermitentes, luzes mal-criadas, essas coisas das cinco horas. A orquestra tocava as peças do Sufjan e o sono mostrava o poço e todos os pensamentos convergindo para seu desconhecido fundo. Vez ou outra vazavam pela janela uns fragmentos do bronze que escapava do sol. Contornos épicos a cena ganhava. Me doeu ver o surdo-mudo entrar, distribuir seus pequenos papéis e voltar recolhendo um por um, sem qualquer moeda ou nota junto. Eu ouvia “Crying Lightining” então, uma irritação tácita e sub-reptícia estava dando as cartas. Disparidades. Pertencimento. Rumo. Escolhas. Parecia deslocado na festa. Na casa errada. Na hora errada. Porta errada. Eu errado. Onde é que eu fui me esquecer?

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