segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Pterodactilografia

Gosto de manhã. Um ser cheio de musicalidade que usa as palavras com distinta doçura e objetividade, o que a faz falar de si como se falasse do mundo todo junto. A apresentação fica ao lado e é seu trailer perfeito. Ela é um filme. Vários filmes dentro do mesmo. Letras de Beterraba e "Sleep Walk". Ou até mesmo a "Ne me quitte pas" que ficou pelo caminho. Ela é um mistério, e mesmo assim, nunca se viu nada tão cristalino. Madrugada e café. Lua e estrela. Ela se anuncia com o Mi menor, mas não há nada mais Lá maior do que ela. Ela é uma harmonia de quatro acordes. A F#m D E. Nem Junky nem Lonesome Traveler. Onde está o Rubem Fonseca nesse instante?

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Há dissonâncias demais, desencontros, desvios, desníveis, desasossegos, dislexia dos passos, John dos Passos, Senhor dos Passos e o cara que comprava os discos por uma ninharia, como fez com o Beatles for Sale que deixei lá mas que substituí por quinze pratas meses atrás. Há cálculos por fazer, renegocioação de expectativas, esperanças submersas bem longe do Pacífico, há tanto por pagar e tanto por agradecer, tanto por chorar, por duvidar, por arrepender. Ti-Jean, que tanto me marcaste com suas palavras, a década de 70 não te viu como não viu ao J. H., o maior guitarrista de todos, salve, assim como os Beatles ficaram pelo caminho não pela filha do banqueiro de Tóquio, mas pelos egos monstruosos que faziam sombras monumentais sobre os quatro moleques que dormiam amontoados em beliches de ferro em Hamburgo, exaustos mas rumo ao topo, Johnny.
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Não consigo relacionar as palavras-chave. Perco chaves. Episódios. Aulas. Tempo. Risos. Paciência. "A tristeza é um bichinho que parrueta sozinho. E como rói a bandida. Parece rato em queijo parmesão". É por aí. Não. É exatamente aí. Anoto os sonhos. Marco os bumbos no ônibus. "You only live once". Acerto todos. As ruas não me olham. Joguei as chaves pro alto e caíram na coluna e perdi os tênis tentando tirá-las de lá, o que ganhei foram meias molhadas e uma bronca do dono do bar pelo atraso pra levar o gás.

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Preciso começar de algum ponto.

Moedas.

Saudade.

Adeus nada, eu acabei de chegar.

E eu sempre estou indo pra algum lugar.

Blue Velvet. In dreams.

Nove de Março, Avenida Londres, Meia Um Meia, às Cinco e Meia.

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Parte disso foi dito em "Amor Supremo Coltrane Futebol Clube". Palavras de acrílico justapostas, datilografadas no ar, o papel não é ferido. Eu ia pro banheiro pra jogar conco minutos fora, umas quatro vezes por dia, porque aquilo lá era bem chato. Havia a mulher fumando na janela. Havia a hora do estica-e-puxa. O ascensorista Botafoguense que sempre aceitava os biscoitos que eu oferecia. Não é nostalgia. É fotografia. Recorte. Ayahuasca em pó solúvel, rende cinco litros. Sobretudo, humano. Pra onde se aponta há rastro do pensamento de alguém. Você não foi o primeiro. "No caso do Haiti, foi pela reescravização, não?". Só eu salvei esta frase. Grande coisa. Preciso ver Angel's Flight. Como precisava ver o Dakota. Prefiro a desconstrução do que a demolição, embora haja o irreversível e o imponderável na mesma frase, e isso é bastante perigoso. Preciso dormir. Mais da metade de tudo que penso não sabe que eu existo. Apenas números. A propriedade da palavra escrita é subjetivamente adquirida por quem a lê. Não me culpe nem me absolva. Me agregue. Me inclua. Me seja. Me ame. Tchau.

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